Entre águas e esperanças: missão nas comunidades ribeirinhas do Amazonas

07 de julho de 2025

Esta crônica narra uma experiência transformadora, onde a missão não apenas leva Jesus, mas O descobre já presente em cada sorriso, em cada remada, em cada gesto simples de amor.

Por Sérgio Warnes*

No dia 28 de junho de 2025 partimos pela manhã para uma das experiências mais desafiadoras e enriquecedoras da nossa formação: visitar as comunidades ribeirinhas do rio Amazonas.

Nós, noviços, junto com nosso mestre, padre Julio Caldeira, seguimos rumo às comunidades do Parauá, em Careiro da Várzea, visitando Nazaré do Parauá, Nazaré do Tarumã, São José do Jauaçú e São Francisco do Parauá. A cheia do rio Amazonas havia transformado completamente a paisagem. A terra firme era quase inexistente, e a mobilidade só era possível de canoa, entre casas de madeira flutuantes sobre as águas. Era como se a floresta tivesse nos engolido e, em meio a esse cenário imponente, a missão nos revelou seu verdadeiro rosto.

Um rosto humano, generoso e profundamente crente

A maior lição que tiro dessa vivência é o tempo partilhado com a comunidade, com a criação e com Deus. A generosidade das pessoas é algo que comove a alma. Ofereceram-nos o pouco que tinham e, ao ser doado, se tornava muito. Sua naturalidade revela um coração livre e aberto.

Apesar das carências materiais, a fé é viva e dinâmica, expressada na fraternidade, na devoção e na acolhida. São testemunhas de que pobreza não é sinônimo de tristeza, e que a riqueza espiritual é real e abundante em meio à floresta.

Imagens que marcam a alma

Uma imagem ficou gravada na minha memória: crianças remando sozinhas em uma canoa, cruzando as águas com uma destreza admirável. Elas já estão acostumadas a essa realidade dura e desafiadora, mas aquilo que vemos como dificuldade, elas enfrentam com coragem cotidianamente.

Nesse contexto, compreendi uma verdade: o medo de cair na água é como o medo de enfrentar a missão. Mesmo sem saber, com sua vida essas crianças nos ensinam resistência, coragem, esperança e fé.

O jubileu da fé amazônica

Neste Ano Jubilar, reconhecemos com profunda admiração a caminhada de tantos homens e mulheres que, mesmo no meio da floresta, caminham, remam, cruzam rios inteiros só para se encontrar com o grande Amante da nossa existência: Jesus Eucarístico.

É uma peregrinação cotidiana. Eles avançam, e nós com eles. Como bem disse o padre Júlio: “Somos chamados a remar mar adentro e lançar novamente as redes, sem medo, porque o Senhor está no barco”.

O tempo: o presente do missionário

Nosso saudoso mestre, padre José Martín (missionário da Consolata, falecido recentemente, era o mestre dos Noviços), costumava dizer: “O tempo é a solução para nossas dúvidas e inseguranças”. Na missão, esse tempo se torna o presente mais valioso do missionário: tempo para escutar, rir, partilhar, consolar... tempo para que a comunidade se sinta amada e acompanhada.

É nosso dever como cristãos levar Jesus até as margens do rio, às casas de madeira, no meio da floresta, cruzando as águas, suportando o calor, os pernilongos (carapanãs), a umidade. É difícil, sim, mas vale a pena. Porque o Evangelho não fica trancado entre quatro paredes, ele caminha e atravessa até os confins do mundo, buscando a salvação da humanidade.

E mais do que levar Jesus, descobrimos que Ele já está ali em cada olhar, em cada gesto, em cada sorriso generoso de quem oferece um prato de comida. Nossa tarefa como missionários da Consolata é tornar visível a ação de Cristo em cada coração. Levamos consolo, testemunho e amor encarnado... e muitas vezes, somos nós que voltamos mais consolados.

Uma vida volátil, mas cheia de sentido

A vida missionária é volátil. Nessa missão, dormimos numa casa, tomamos café em outra, celebramos em diferentes lugares, tomamos banho com a água do rio. Em meio a tanto dinamismo, tudo ganha sentido quando o coração pulsa pelo Reino. A missão nos recorda o muito que recebemos… e o quão pouco damos. Ou, ao menos, não o suficiente.

Voltaremos, sem dúvida. Porque a missão continua. E o rio nunca para. Onde há uma comunidade que espera, Jesus também nos espera.

* Sérgio Warnes é noviço no Noviciado dos Missionários da Consolata em Manaus, Brasil.

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