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Fé em Ação

COP30: Transição ecológica e transformação da realidade

Por Marcus Eduardo de Oliveira (*)

A Organização Meteorológica Mundial (OMM) prevê em relatório: as temperaturas médias de longo prazo do planeta ultrapassarão 1,5 graus Celsius pela primeira vez em 2027, muito antes do estimado pelo IPCC, Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas. Enquanto isso, a economia global do excesso – o modelo de crescimento que nos guia - continua em delírio, desrespeitando a regeneração da natureza. Assim, o clima está mais quente e as ondas de calor, confirmadas pela ciência, já matam todos os anos mais de 500 mil pessoas. O meio ambiente – a Casa Comum da Vida - agoniza. O planeta, cada vez mais doente, sangra e grita (de 31 sinais vitais da saúde planetária, ao menos 18 deles estão seriamente comprometidos). O ar segue muito poluído (são 11 milhões de vítimas fatais todos os anos no mundo). As florestas viram cinzas e os animais, desde muito, estão no radar da extinção (em apenas 50 anos, o mundo já perdeu 73% de vida selvagem). 

Como se não houvesse o amanhã, os humanos, sempre chamados de “modernos”, seguem devorando os recursos da Terra. Faz tempo, por sinal, que a nossa Amazônia Legal (59% do território brasileiro) está virando pasto. É o costume de sempre, dirão alguns! Em meio a essa loucura, o projeto civilizatório, como se supõe, corre riscos. 

Do ponto de vista prático, resta claro que os mais ricos (e privilegiados) são os que mais emitem gases de efeito estufa. Os mais pobres, na contrapartida, são costumeiramente aqueles que pagam a conta. Na lógica disso tudo, o lucro (economia de curto prazo) fala mais alto. 

Seguindo a toada, diante dos extremos, já não se fala mais em mudança climática, mas sim em EMERGÊNCIA CLIMÁTICA. 

Outros ainda, tendo em vista a proximidade dos pontos de inflexão (tipping points), são mais diretos e não hesitam em chamar de COLAPSO CLIMÁTICO.

No coração da Amazônia

Mas, a COP30 (30ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima – UNFCCC), no coração da Amazônia, vem aí. 

E vem com a missão de ser símbolo de uma nova economia verde, em que a restauração florestal e a inovação climática, valores que precisam se combinar, ocupem mais espaço. 

Assim sendo, é chegada a hora de discutirmos com mais seriedade o impasse civilizatório (na verdade, uma policrise do capitalismo) que o mundo moderno vem passando por conta do agravamento da crise climática.

O que está em jogo?

Diante da perturbação ecossistêmica, do desafio da mitigação e do agravamento dos danos ambientais, pergunta o senso comum: o que está em jogo?

A continuidade do desmonte ambiental ou a recuperação?

A resiliência planetária ou a supremacia do capitalismo predatório?

Ruptura ou manutenção? 

Separação irreversível ou reconciliação com a natureza - matriz de tudo?

Ora, para todos que ansiamos em poder construir na base e no todo uma sociedade mais justa e resiliente, parece lícito imaginar, sem muito esforço, que as discussões na COP30 devem desesperadamente pautar as bases de uma nova civilização ecológica, caso queiramos imprimir certa qualidade ao sistema vida. 

Para tanto, urge levantar medidas concretas de conservação, de proteção e financiamento de florestas, além, é claro, do desenvolvimento sustentável. 

Dando o exato tom da conversa na COP30, a pauta “revolucionária”, digamos assim, vai da transição energética justa ao fim do desmatamento. Vai da conservação dos oceanos à adaptação climática. De sistemas alimentares eficientes à proteção da biodiversidade. Do combate à poluição à proteção irrestrita da natureza. 

Contas feitas, é fato que a COP30 - verdadeiro corpo de ação - deve inicialmente propor a realização de uma completa assepsia na ferida do mundo moderno: o modo de vida da humanidade mais rica e privilegiada do planeta. Afinal, não é devorando o planeta que nos acolhe que nos tornaremos modernos. 

Sendo franco, nenhum progresso será possível se, antes, nossa sociedade humana não enfrentar com muita disposição a complexidade climática.

Em tempos de crise climática e ambiental, nossa consciência clama por levantar uma meta única: priorizar a sustentabilidade, valor que procura devolver o equilíbrio à Terra. 

Nesse sentido, o Brasil, vale o registro, tem participação decisiva em todo esse processo. Evitar o agravamento do colapso climático está na ordem do dia, assim como proteger a sociobiodiversidade. 

Falando de modo simples, não é segredo que sem a transformação estrutural da economia não avançaremos. Assim, a oportunidade é histórica e urgente.

A transição para uma economia de baixo carbono precisa ser entendida como nossa definitiva saída da armadilha em que o capitalismo predatório nos meteu.

Em nosso caso em particular, soluções baseadas na natureza, restauração de ecossistemas, bioeconomia e floresta em pé completam, por assim dizer, o roteiro conhecido para alcançarmos um meio ambiente saudável e resiliente, eficiente e não poluído. Não há mais tempo a perder. 

Ainda em nosso caso, elencando responsabilidades, competências e deveres, muito se afirma que o Brasil apresenta todas as condições para se tornar o primeiro país tropical desenvolvido da história, afinal, temos a matriz elétrica mais limpa do mundo; temos uma matriz energética com 47% de recursos renováveis (a média no mundo é de 14%).

E temos agricultura de baixo carbono e a possibilidade de dobrar a produção de bioenergia até 2050 (impulsionando tecnologias de descarbonização no transporte e na energia - não por acaso, o pacto dos combustíveis limpos faz parte da Agenda de Ação Brasileira para a COP30).

Temos ainda condições de se tornar um país carbono negativo, que significa retirar mais carbono que o país emite. 

Voz do Sul Global

NA COP30, como uma potente voz do Sul Global, o Brasil foi um dos primeiros países a entregar suas NDCs, Contribuições Nacionalmente Determinadas: reduzir as emissões líquidas de GEE entre 59% e 67% até 2035. 

Nesse cenário, como uma coisa está diretamente ligada a outra, é senso comum que precisamos aprender a olhar para a Amazônia, o que implica, num primeiro momento, em levantar esforços para desmontar a economia do desmatamento. 

Dito de outra forma, assusta saber que, até hoje, trocamos vegetação nativa por commodities. 

Pesar reconhecer que estamos atrasados em relação ao que o mundo vem fazendo com precisão: colocar preço no carbono. 

Quer dizer: incentivar quem protege o clima e cobrar de quem ajuda a poluir.

Sendo assim, na COP30, a maior vitrine para assuntos relacionados ao clima, poderemos afirmarmos ao mundo que não cabe mais visões reducionistas. Com a COP30, temos o dever de “realocar” a Amazônia (território vivo) no centro de debate climático, informando ao mundo moderno que temos todas as possibilidades de levar adiante um novo ciclo de projeto de desenvolvimento responsável que inclui soberania científica, preservação e inovação; biodiversidade e potência energética; serviços ecossistêmicos, floresta e populações locais respeitadas. 

Na COP30, será a hora de todos promovermos o debate necessário: a transformação da realidade.

Na COP30, despertando atenções, também será o time de “expulsarmos” (figuradamente falando) os países pouco interessados na agenda da recuperação socioambiental.

Na COP30, salvando os juízos responsáveis, será o momento de consolidar o Fundo Florestas Tropicais para Sempre, TFFF, privilegiando países que se esforçam para manter suas florestas tropicais (financiar a conservação florestal), com uma lógica básica: reduzindo o desmatamento tropical, pode-se captar 125 bilhões de dólares nos próximos anos, sendo US$ 25 bilhões dos demais governos e US$ 100 bilhões com recursos privados.

Por fim, a COP30 será o palco mais apropriado para reafirmar uma mensagem objetiva: é muito mais barato reduzir o desmatamento. Conservar a natureza não é tão caro quanto se imagina. Na Amazônia, desmatar sai mais caro (principalmente com investimento em máquinas e na limpeza do local) que recuperar pastagem. 

Na COP30, em nossa casa, será o momento preciso para o Brasil gritar ao mundo que proteger nossa floresta é, antes de tudo, prioridade nacional.

(*) É economista e ativista ambiental. Mestre em Integração da América Latina pela Universidade de São Paulo – USP (2005). Autor de Civilização em desajuste com os limites planetários (CRV, 2018) e A Civilização em risco (Jaguatirica, 2024), entre outros.prof.marcuseduardo@bol.com.br

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