COP30: Apurando os acontecimentos em Belém
Faltou consenso em temas críticos. Os Estados Unidos (segundo maior emissor individual de emissão de gases de efeito estufa) não apareceram. A China, maior emissora do mundo no momento, fez jogo de cena.
A COP 30, Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas, reunindo representantes de 195 países, chegou ao fim, deixando cada vez mais claro que a urgência por ação climática nunca foi tão grande.
Contudo, como já aconteceu em outras edições, compromissos climáticos permanecem completamente ignorados. Assim, de forma evidente, são crescentes as divisões em torno da segurança climática do planeta.
Tal e qual, como era de se esperar, Belém entregou avanços e frustrações; desafios e conquistas. Sequer houve avanço para solucionar duas causas básicas da ação climática: a queima de combustíveis fósseis e o desmatamento.
Na prática, vale lembrar, Belém entregou o que era possível. “Qualquer texto sem uma menção clara para reduzir o consumo de combustíveis fósseis é frustrante e não vai na direção do que a ciência defende”, enfatizou Carlos Nobre, nosso principal e mais respeitado climatologista.
Apesar disso, 195 países representantes aprovaram o chamado Pacote de Belém - 29 decisões que incluem avanços em temas como financiamento da adaptação, comércio, gênero e tecnologia.
Em linhas gerais, Alemanha, Noruega, França, Brasil e Indonésia, juntos, se comprometeram a entregar mais de 6 bilhões de dólares para o TFFF, o Fundo de Florestas Tropicais para Sempre (financiamento de longo prazo para a proteção e florestas).
Dezessete países aderiram ao Desafio Azul, comprometendo-se a integrar soluções oceano-clima nos planos nacionais.
Permanece a longa distância – faltou consenso em temas críticos
Em todo caso, importa esclarecer, com a força das evidências, que permanece a longa distância entre o que foi falado e o que o mundo moderno, de fato, precisa fazer para conter o aumento da temperatura global – limitar o aquecimento em 1,5 Grau.
A declaração principal, chamada de Decisão Mutirão (que reafirma o compromisso dos países com o Acordo de Paris), não menciona os combustíveis fósseis em nenhuma linha.
A propósito, “os interesses econômicos e geopolíticos, associados à indústria do petróleo, acabaram levando a melhor na conferência”, lembrou Paulo Artaxo.
O tema Perdas e Danos (consequências das mudanças climáticas que vão além da capacidade de as pessoas se adaptarem) teve pouca atenção.
Ao final, 122 países – que respondem por 75% das emissões globais – apresentaram suas NDC´s, novos compromissos nacionais - mas, ainda assim, entregaram menos de 15% das reduções necessárias até 2035.
De concreto, a COP da Floresta (nome que não chegou a emplacar como desejado) tratou com certo desdém a principal ideia que norteia a mudança climática: fazer a transição para longe dos combustíveis fósseis.
Na verdade, faltou consenso em temas críticos. Os Estados Unidos (segundo maior emissor individual de emissão de gases de efeito estufa) não apareceram.
A China, maior emissora do mundo no momento, fez jogo de cena.
A Arábia Saudita sequer mencionou o termo “combustíveis fósseis”, e a União Europeia, sem ineditismo, se esquivou de levar adiante a promessa de financiamento climático (ainda permanece muito abaixo do necessário).
A Meta Global de Adaptação, embora aprovada, foi reduzida de 100 para 59 indicadores voluntários (distribuídos em sete setores, como água, alimentação-agricultura, saúde, ecossistemas e meios de subsistência).
Esses indicadores formam a base comum usada para acompanhar se os países estão se preparando para conter a grave crise do clima e os eventos extremos.
O Mapa do Caminho
O Mapa do Caminho, defendido pelo governo brasileiro em conjunto com a Colômbia (e mais de 80 países), não vingou.
Na verdade, bateu de frente com países produtores de petróleo, e ficou de fora da chamada Decisão Final.
Ainda assim, a presidência da COP seguirá trabalhando nos documentos ao longo de 2026 com a intenção de apresentar dois específicos documentos (sobre combustíveis fósseis e desmatamento) antes da COP 31.
De toda sorte, Belém trouxe para o palco de discussões, de maneira inédita, o reconhecimento dos direitos indígenas como estratégia climática. O cacique Raoni e o xamã Davi Kopenawa yanomami, presentes, enfatizaram a participação dos povos indígenas (mais de 2,5 mil vozes indígenas ecoaram em Belém) na proteção das florestas.
De igual modo, as mulheres (indígenas, afrodescendentes e rurais) lideraram a aprovação do Plano de Ação de Gênero de Belém. Assim sendo, de forma mais ampla, ficou evidente a necessidade de conectar o regime climático à vida das pessoas. Nessa direção, a Marcha dos Povos, ponto alto da COP 30, levou mais de 70 mil pessoas às ruas de Belém, numa defesa direta por inclusão, equidade e responsabilidade compartilhada.
Marcus Eduardo de Oliveira é economista e ativista ambiental. Mestre em Integração da América Latina pela Universidade de São Paulo – USP (2005). Autor de Civilização em desajuste com os limites planetários (CRV, 2018) e A Civilização em risco (Jaguatirica, 2024), entre outros.